
A Igreja de todo Brasil vive as alegrias das vésperas do Jubileu dos 300 anos do encontro da imagem de Nossa Senhora Aparecida no Rio Paraíba do Sul. No ano de 1717, três pescadores, levados por necessidades históricas e econômicas, saíram a pescar, numa época escassa de peixes. Por ação misteriosa de Deus, chegando ao “Porto de Itaguassu”, a primeira coisa que caiu em suas redes foi o corpo de uma imagem quebrada, na altura do pescoço. Num segundo lance de rede, pescaram a cabeça da mesma imagem. Juntando as duas partes viu-se que se tratava da Senhora da Conceição. Depois do encontro da Imagem, a pesca de peixes foi abundante e os pescadores intuíram a presença e ação de Deus naquele singular evento. Por assim ter aparecido, o povo chamou-a de “Aparecida”.
Coincidentemente nesse tempo, a nossa querida Três Rios, no vale do mesmo Paraíba do Sul, é surpreendida, depois de 133 anos, com o encontro das relíquias mortais de sua veneranda e benemérita fundadora, a Sra. Mariana Claudina Pereira de Carvalho, a Condessa do Rio Novo, filha de Antônio Barroso Pereira, 1.º Barão de Entre-Rios, e irmã do Visconde de Entre-Rios. Tais relíquias da Condessa, falecida a 5 de junho de 1882, em Londres, onde se encontrava em tratamento de saúde, é encontrada numa urna de madeira, num jazigo no subsolo da Igreja de St. Mary’s. Isso foi possível à dedicada, persistente e lucida investigação da historiadora e pesquisadora trirriense Cinara Jorge, que se fez cercar de um impar aparato cientifico e de instituições afins.
A relevância histórico-sócio-econômico-cultural dessa descoberta é, não apenas para Três Rios, mas para todo o Brasil. A Condessa do Rio Novo ultrapassa séculos de seu tempo histórico aristocrata, escravagista e depredador do meio ambiente. Destina parte da sua Fazenda do Cantagalo para a obra assistencial que planejara em Paraíba do Sul, a Casa de Caridade, com a recomendação de que "as terras próximas à Estação de Entre-Rios" (hoje essas terra compreendem o centro da cidade de Três Rios), poderiam ser aforadas para os que ali quisessem residir. Tratava com essa recomendação de garantir recursos perpétuos àquela futura casa de assistência social.
Essa magnânima obra social, persistente até os nossos dias, foi o primeiro passo que veio se desdobrar na abolição dos escravos, oito anos antes da Lei Áurea. Mas a ação da Condessa do Rio Novo foi além da liberdade despossuída outorgada pela Princesa Isabel, que com o seu decreto jogou o povo negro, sem pão e sem teto, nas estradas. Ela fez a primeira Reforma Agrária que se tem notícia no país, doando a Fazenda do Cantagalo aos negros alforriados que ela preparou e formou para o intercâmbio comercial com os demais fazendeiros e o comércio local e regional. Nesse esforço incluiu inclusive a aprendizagem de línguas estrangeiras. E ainda criou a primeira reserva florestal que também se tem notícia, preservando intocável a Mata Atlântica da Fazenda de Bemposta.
Cuidado das crianças, enfermos e pobres, libertação da escravidão, democratização do saber, reforma agraria, economia solidária, e reserva ambiental constituem o legado da precursora de uma nova sociedade, com a qual todos ainda sonhamos e pela qual lutamos. A Condessa é um ícone da compaixão, da justiça, e da paz para os nossos dias. Saibam as autoridades competentes, com a participação da sociedade, resgatar e valorizar suas relíquias mortais para honra de nossa terra e para o presente e o futuro da história nacional. A Dra Cinara Jorge fez de forma sobeja a sua parte! Cabe a nós agarrar a herança da Condessa que se fez mãe libertadora dos escravos, na sequela de Nossa Senhora Aparecida que se fez um deles, para a todos libertar!
Medoro, irmão menor – padre pecador